quinta-feira, 26 de junho de 2014

Resenha do filme clássico "E o vento levou"


FICHA TÉCNICA
Gênero: Drama                Direção Victor Fleming     Ano:1939                Roteiro: Sidney Howard
Elenco: Alicia Rhett, Ann Rutherford, Barbara O'Neil, Butterfly McQueen, Cammie King Conlon, Carroll Nye, Clark Gable, Cliff Edwards, Eddie "Rochester" Anderson, Eric Linden, Evelyn Keyes, Everett Brown, Fred Crane, George Reeves, Harry Davenport, Hattie McDaniel, Howard C. Hickman, Irving Bacon, Isabel Jewell, J.M. Kerrigan, Jackie Moran, Jane Darwell, Laura Hope Crews, Leona Roberts, Leslie Howard, Lillian 
Kemble-Cooper, Louis Jean Heydt, Marcella Martin, Mary Anderson, Mickey Kuhn, Olin Howland, Olivia de Havilland, Ona Munson, Oscar Polk, Vivian Leigh....

O filme trata especificamente o período compreendido pelo acontecimento da Guerra Civil Americana ou Guerra da Secessão (1861 - 1865), entre o Sul (Confederados) e o Norte do país (Yanques). As diferenças entre esses dois polos do país se explica,  em grande parte,  pela forma inicial de colonização das duas regiões, sendo que no norte se praticou uma ocupação de permanência, onde os colonos tinham o objetivo de fazer das terras que ocupavam sua morada definitiva. No sul, o sistema colonial escolhido foi de predomínio das grandes propriedades dedicadas á monocultura (plantation),com a utilização de mão de obra escrava (já extinta no norte).
Numa dessas fazendas do sul, nasce a voluntariosa Scarlett O´Hara (Vivien Leigh), uma garota bem nascida, branca, de família iminente na região, descendente de irlandeses por parte de pai, que coleciona pretendentes. Porém Scarlett é apaixonada por um homem que, não obstante ser um igual em origem, é comprometido por laços sociais ao matrimônio com uma prima (Melanie). Apesar de amar Scarlett, Ashley sente que não poderia casar-se com ela, por serem diferentes e sentir nela uma diferença comportamental já notória para um compromisso duradouro.
Com o advento da guerra, Ashley casa-se as pressas com Melanie, e Scarlett para não ficar atrás, casa- se com o irmão de Melanie para manter-se próxima de Ashley. Nessa primeira parte do filme, podemos perceber no comportamento de Scarlett, a transgressão total do papel feminino imposto pela sociedade da época: Ela mente, articula estratégias para manter-se próxima do seu objetivo, declara-se abertamente para Ashley, falseia sentimentos por Melanie conquistando sua confiança. Em meio os arrochados espartilhos e a fome excessiva de comida e de vida, Scarlett procura de todas as maneiras, burlar as regras sociais que a cerceiam.
Viúva precocemente, Scarlett se ver responsável por Melanie e o filho de Ashley e retorna a Tara (fazenda de sua família, fonte inesgotável de sua força e amor) buscando proteger-se da devastação da guerra. Tudo o que estava ocorrendo muda a vida da garota, que perde seus luxos e passa de uma menina mimada a uma mulher forte e decidida. Ao voltar e encontrar a terra devastada, a mãe morta, o pai louco, as duas irmãs prostadas por Tifo, apenas dois escravos do contingente que a família possuía e a fome desoladora, Scarlett promete a si mesma que não será destruída e que fará qualquer coisa para atingir seus objetivos. Para preservar a fazenda da família, ela não mede esforços e será capaz de todas as transgressões possíveis, até mesmo mata para proteger a propriedade e é acobertada por Melanie.
Nas relações em festas no centro urbano (Atlanta) onde morava sua tia, ela conhece Rhett Butler (Clark Gable), um charmoso aventureiro disposto a tudo por uma aventura amorosa e por lucros. Esse é verdadeiramente seu igual, conhece o teor da alma de Scarlett e faz de tudo para seduzi-la, mas não consegue retirar o amor dela por Ashley. Em vários momentos Rhett a socorre, mas a relação conflituosa se estende desde o primeiro matrimônio de Scarlett até o fim do segundo (pois ela rouba o noivo da irmã) por ser esse um eminente empresário no ramo de madeireiras.  
Scarlett escandaliza em diversas esferas: trata diretamente com homens quando no período uma mulher não poderia dirigir-se a um homem sem uma acompanhante idônea, dançou com Rhett por dinheiro voltado á causa quando viúva, odiava usar preto, dirige seu próprio “coche” (carro, na atualidade), controla os negócios, coisa inadmissível para uma mulher. Ao ser flagrada em cenas de carinho com Ashley, recebe o desprezo e a exclusão das senhoras e é apoiada por Melanie.
Scarlett é a ruptura definitiva da heroína clássica: é forte, decidida, disposta a correr riscos no que tange a reputação, mas sua inconstância e interesse fazem com que ela concorde em casar-se com Rhett. Depois de dar a luz uma filha, Scarlett comete outra grande transgressão que para a época era pecado mortal: diz abertamente não querer mais ter filhos, o que para um machão como Rhett significava uma espécie de rejeição. O casamento aparente prossegue e nisso Scarlett não é diferente das mulheres de sua época. Rhett é totalmente dedicado a educação de Bonnie e a leva para viver com ele. Passado algum tempo, ele retorna para casa e nessas muitas idas e vindas, Scarlett o encontra bêbado e aí.... tenho a impressão de um estupro consentido. Isso é que derruba por vez toda a construção da personagem, quando ela acorda toda feliz na manhã seguinte, depois de ter sido “estuprada” pelo marido. Essa cena é a mais problemática de E o Vento Levou, junto com todas as que mostram qualquer personagem negro.
Realmente nos vem a ideia de que o diretor quer domar a personagem, que em muito, extrapola o suporte que a mídia da época permitia. Ao anular Scarlett na sua decisão de manter-se longe de Rhett, depois de longos anos em que ambos foram infelizes, colocá-la como derrotada pelas próprias emoções não fazem jus ao complexo personagem que ela é. Scarlett dizer “o que vou fazer sem você?” no final do filme chega a ser piegas para uma mulher que passou o que ela passou. Acredito  que ela possa ter amado Rhett. Mas não nos moldes tradicionais. Esse ela sente por Ashley, que no fim, passa a não corresponder as expectativas, já que não é capaz de administrar a própria dor da perda e Melanie a faz prometer que cuidará dele no leito de morte. Esse não é o jovem que ela amou, assim como ela não é mais a jovem ingênua do passado. Scarlett só possui uma coisa mais importante que a faz renascer sempre: o sentido de sua origem e o amor incomensurável que sente por Tara. Isso a torna digna de entrar na galeria de personagens marcantes da sétima arte.

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